Monday, April 4, 2011

A minha sala

A minha sala favorece um sentimento de sonolência naqueles que a habitam ou frequentam ocasionalmente. Sendo a única divisão interior da casa, a luz que lhe chega mais imediata e directamente é a que vem da janela do quarto e que se reflecte na sua parede rosa forte, dando um tom vagamente crepuscular à zona do sofá. Já a parede defronte deste, sofre com o filtro alaranjado dos cortinados da marquise que lançam sobre a TV um foco triangular, esculpido pela porta da cozinha entreaberta. Poderia ser problemático, não fosse o pequeno ecrã estar, nestas alturas do dia, ligado apenas com o propósito de combater a sonolência através do seu barulho de fundo. Às vezes sobrepõem-se os sons, quando a vizinha de baixo decide espancar furiosamente o chão e as paredes da sua casa, esconjurando inimigos mudos e indecifráveis. Ou quando assisto, em simultâneo, ao vídeo de algum músico ou banda no youtube e a melodia destes remete a TV para o papel de ruído estridente. São os dois primeiros aparelhos que ligo quando entro na sala, além das luzes se o sol já se estiver a pôr. Com o Outono no calendário, mesmo o acordar dos dias começa mais tímido e normalmente a luz que vem do quarto não é suficiente para dar à sala o amanhecer necessário. Quase sempre tenho de ligar um dos candeeiros – as luzes que sobraram depois de se terem fundido as lâmpadas do tecto, numa casa com cerca de 3 metros de pé direito. Agora a do candeeiro mais usado também se fundiu, privando-me logo à partida do foco que ilumina a zona do computador, além de dificultar qualquer busca que tenha de fazer na papelada que se amontoa caótica e empoeirada, de lado. Às vezes sinto que esta é a zona que menos conjuga com o resto da sala. A mesa metálica de computador que adaptei a mesa de escritório, destoa do resto da mobília e não facilita a arrumação, tanto que a tralha e a papelada já ultrapassaram as prateleiras de arquivo coloridas que comprei na esperança de organizar e alegrar esse símbolo de arquitectura de escritório, frio e metálico. Agora também os braços do sofá servem para albergar as revistas e outros papéis sem poiso definitivo. Penso que às vezes terão encontrado maior conforto do que eu. O apelo visual do meu sofá crú, de rebordos castanhos, tão difícil de encontrar na versão sofá-cama, contrastante com o tom mel da madeira do chão, não encontra paralelo no aconchego físico que proporciona. Quando nos esticamos para descansar, é profundamente encurtado pelos braços duros, forrados a napa, e pela rigidez dos almofadões, que o mantém a uma altura considerável do chão. Uma distância que, no entanto, permite respirar melhor o aroma tropical das velas perfumadas, distribuídas pela mesa de apoio, ao alcance de um palmo do braço do sofá, e de onde salpicam a parede rosa forte com manchas mais claras e trémulas, afastando os odores bafientos e asfixiantes, que se escapam, a espaços, do andar de baixo.