Saturday, May 22, 2010

Funny the way it is

Há muito tempo que não escrevo aqui. Ferrugem, preguiça e a sedução das instantaneidade e interactividade do facebook têm-me feito estar ausente da blogosfera.
Mas há coisas, reflexões, que requerem mais tempo e espaço virtual.
Mesmo quando essas coisas são aparentes trivialidades.
Uso, então, este regresso para falar de uma aparente frivolidade, mas com umas lições pelo meio: concursos de talentos.
Há dias estava a ver os episódios antigos do concurso "Achas Que Sabes Dançar" e num deles apareceu um concorrente de 15 anos, um miúdo, estudante e trabalhador (empregado como caixa de supermercado) cheio do sonho de ser bailarino. Não teve sucesso na coreografia, nem mostrou particulares dotes de dançarino, mas teve humildade para aceitar as críticas do júri: júri composto por 3 pessoas, sendo que uma percebe do assunto, outra fala mais do que aquilo que percebe e outra que não percebe nada, nem quer perceber, limitando-se apenas a fazer as vezes de um MMSantos, no papel de burgesso do trio. Foi desta última personagem do painel de jurados que saiu a crítica mais estúpida e preconceituosa, e até insensível, face à prestação do jovem aspirante a bailarino. «És caixa num supermercado? Então, devias aproveitar para limpar o chão e treinares uns passos com a esfregona», atirou o tal MMSantos wannabe.
Felizmente, na sua ingenuidade adolescente, o jovem não percebeu o alcance da humilhação. Porque, de facto, ele até nem sabia dançar. Mas teria e tem o direito de sonhar como qualquer jovem de 15 anos, ainda que tenha de o fazer no tempo que sobra da sua condição de trabalhador estudante. Mais do que o sonho de ser bailarino tem o direito a sonhar com um futuro, a ter aspirações maiores e legítimas - tudo o que um concurso daqueles não pode dar -. Um direito de todos, mesmo dos caixas de supermercado, e não apenas daqueles que têm tempo, disponibilidade, dinheiro ou estatuto, à partida, para o fazer.
Esta foi a lição má.
Num outro concurso do género, mas desta feita dedicado ao design e na versão norte-americana original, o'Top Design', o júri é mais polido, percebe realmente do assunto e a selecção do leque dos melhores é feita à porta fechada e sem comentários jocosos ou humilhações.
Escolhidos os mais talentosos parte-se para cada uma das eliminatórias.
Um dos concorrentes do último 'Top Design' que acompanhei era execrável. Ao que parece o senhor trabalhava para a revista decorativa da Martha Stewart, achava-se o melhor de todos, desdenhava o júri, julgando-se superiormente conhecedor da matéria (por que estava ali, então?). Além disso, tentou prejudicar um dos concorrentes, que até aí não lhe tinha oferecido grande concorrência, simplesmente porque ele não falava muito e não se saberia, assim, o que estava a pensar. «Eu não gosto do Preston», disse como que avisando que a sua irritação à moda do 'só porque sim' estava prestes a materializar-se em alguma coisa. Numa das provas, o concorrente execrável teve direito a ser o primeiro a escolher um lustre, que seria a peça central da prova de decoração daquele dia, e também de decidir a ordem pela qual os outros concorrentes escolheriam os restantes candeeiros. Deixou o Preston para último, sem hipótese e com uma peça difícil. Estatelou-se à grande. Não só o tal Preston foi o vencedor desse desafio, compondo uma sala maravilhosa centrada no lustre rejeitado, como também cativou com isso a atenção do júri, passando de despercebido a favorito. Chegou à final, o outro, o execrável da Martha Stewart, não. E nem foi por falta de talento deste, mas sobretudo pela arrogância de quem já se sente à vontade naquilo que faz. Bom, o facto de ser venenoso e mau colega também terá ajudado na expulsão. E esta é a história boa!